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Preciso de dias assim, sem luz. A 19-01-2012, dez dias depois após a data do meu nascimento e no nonagésimo sexto aniversário do meu avô, Portugal foi afectado por uma depressão climatérica e violenta que causou imensos estragos a vários níveis. Cá dentro, apenas a claridade do dia e o som do vento e da chuva. À noite, apenas a claridade das velas e o continuadamente o som do vento e da chuva. Somos irremediavelmente dependentes da electicidade. Durante essas quase 24 horas eternas, assisti não ao desespero daqueles a quem a tempestade destruiu casas e fontes de subsistência, não a quem viu o seu negócio afectado por essa catástrofe, não a quem viu em risco a própria vida, mas o desespero da falta de luz, um vazio profundo e sem dimensão, o lamento. Pessoas que não sabiam simplesmente o que fazer sem luz artificial nas suas vidas e ficaram à espera, à espera, à espera. Imaginei o meu avô a (não) celebrar o seu aniversário à luz das suas candeias de azeite e do lume na sua lareira antiga, na casa onde a minha avó costurava na sua Oliva completamente manual, sem o desespero nem o vazio da falta de um interruptor, cabos e fichas mágicos que à velocidade da luz, dão sentido de independência a todos os seus dependentes. Preciso de dias assim, eu. De ter e criar luz e sentido a partir da escuridão. E tu, livro, foste mais uma vez parte do sol que me ilumina.

"Se estás a ler estas palavras é porque estás vivo."
José Luís Peixoto


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